sábado, 19 de março de 2011

Sonho quatro

Sempre sem reparar no rapaz de caracóis, continuei o diálogo com Andrerens. Que bom voltar a ver amigos de há tanto tempo. Não tenho estado contigo. Eu também não, sabes. É natural. Tenho é estado com a Catarina. Está na mesma. Eu acho que está igual. Pois, essa não melhora nem piora. Igualzinha ao que era na escola, quanto a mim. Vamos é afinar isto que está quase na hora. Somos instrumentos de precisão, que raio. Somos bestas do espectáculo, afinal. Cangurus de palco, feras de carga, só estamos bem a caminhar sobre o fio e com os harmónicos ali, pimba, todos no sítio.

O teu já está? Só mais um toquezinho aqui. Embora. Lá está ele a exibir-se mais um bocadinho. Como um melro que dá o alerta, a amiga do rapaz de caracóis ia lentamente insinuando a conversa. Jonatã continuava sem olhar para mim, seguindo o seu raciocínio de costas com costas, como se estivéssemos os dois numa espécie de confessionário trocado, eu a apertar os parafusos e ele embrenhado num murmúrio que só a custo entendi. Têm de conhecer o Jonatã, dizia ela, enquanto o rapaz continuava o recito. “O meu pei, o meu pei, aquilo é que era um pei!”, dizia num atropelo de comoções. Eu, voltado para Andrerens, permanecia em tom de aquecimento.

Sabes que todas as irmãs mais novas dos meus amigos têm o nome de Inês. A sério? Parece impossível, deve ter sido o nome típico das segundas filhas nessa altura. Pois, tens razão, eu também era para me chamar Inês, mas depois tiveram um rapaz. Entendo-te, se tivesse os nomes das minhas avós, seria Libânia ou Emília. Formidável.

“O meu pei construiu esta casa com as duas mãos.” Alto. Isso não são modos de um convidado. Saiba o jovem que esta casa é da minha família. Passaram todas as férias aqui desde os anos 70. Decido-me a mostrar-lhe as fotos desses Verões azarados, ora deixadas sobre os móveis ou bem apertadas dentro das gavetas da cardência.

Já descomposto, Jonatã deita as mãos aos álbuns. “Ele está aqui”. Remexe nos sacos de lojas, perde-se em coisas de escola impecavelmente organizadas, ou plásticos com cartões de boas festas por preencher. “Eu sei que ele está”. Farto da cena, tento lembrar-me do nome.

João.

Não.

Jonathan, digo no meu melhor inglês. Sai pelo arco da varanda para o jardim, já desorientado, ou talvez atraído pelo cheiro a sardinhas. Lá fora, os outros músicos discutem o estado da relva e a hora a que o sol se põe, para que não bata muito de frente quando chegar a altura. Saio também e puxo-o pelo braço. “O meu nome é Jonatã”. Está bem, mas não me desarrumes muito as coisas que a minha mãe tem isso tudo no sítio.

A 18 de Maio de 1980, às 11h30, a lava assentou sobre a colina, exactamente um dia e um mês depois da erupção. Deu um pinheiro e uma macieira.

terça-feira, 1 de março de 2011

Preciso de um. Fato-de-treino.